sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

"All"deias de Basto

A Região de Basto, fora dos quatro maiores aglomerados urbanos e das ligações entre eles, apresenta uma quantidade infindável de aldeias com características quase únicas. Uma arquitectura vernácula de uma e harmonia tal com a natureza, que ao longe mais parecem cavernas de lobos, como escreveu Torga. Mas dói só de ver aquelas paredes órfãs de telhados e de gente, na sua maioria.
São a identidade de uma época que se está a perder, de um bem saber fazer, de uma época que o homem respeitava o ciclo da natureza, e ela como com uma atitude de reciprocidade e regada com suor de sol a sol, lá lhe ia dando o que se tinha de repartir com os patrões. Uma época que apesar de tudo, deixa boas recordações, e onde está gravada a juventude e as memorias de muitos dos nossos.
Estas aldeias tem coisas boas, muito valorizadas actualmente por isso "não podemos deitar fora o menino com a agua do banho."
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Que futuro para as nossas aldeias?
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Deixa-las morrer, parece-me deixar morrer com elas parte da identidade das nossas terras. sendo necessario a elaboração de planos estratégicos para as dinamizar.
. Não me parece que estas aldeias isoladas consigam vingar no futuro agarradas a um único sector, seja ele o turismo ou a agricultura. Parecendo-me a mim que o futuro possa vir a ser risonho, se conseguirmos conjugar os dois factores.
Os acessos fisicos, devem ser complementados com os tecnologicos, no entanto parece-me que maior parte destas aldeias já os têm.
. A museificação destas aldeias foi uma solução apontada pelo arquitecto Nuno Portas , que a mim me parece falível, pela dificuldade de rentabilização em termos turísticos e de recursos humanos para manter a actividade de uma aldeia museu. Parecendo-me que a melhor forma de as mesmas não perderem interesse é manter a sua produção mesmo que por diminuta que seja, mas de forma a conservar a sua excelencia , e funcionarem como bandeiras de cada aldeia, complementando-os com algum lugar que os confeccione e comercialize e ao mesmo tempo para deitar quem visite e aprecie estas aldeias, claro que tudo isto adaptado à escala de cada lugar.
(sem querer fazer publicidade, vejam o caso do restaurante e estalagem "nariz do mundo")
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Manter a actividade que ainda há nestas aldeias, pode ser um factor importantíssimo e interessantíssimo a aproveitar, complementando-o e atribuindo-lhe dinâmica com outras funções, turísticas de segunda residência, de comércio das especificidades dos produtos para lojas “gourmet”. Mas acho importante construir uma plataforma que possa unir e rentabilizar os interesses destas aldeias. Elas não estão mortas, vivem é com muito sacrificio, e essa é a situação que é preciso alterar.
Outra função que se poderia dar era a de “aldeias lar”, que passaria pela recuperação das habitações e adaptação ás exigências de agora, complementando-as com uma micro clínica geriátrica, de forma a criar condições quer para os idosos que lá vivem, quer para atrair um nicho de investimento por parte de pessoas idosas que fartas da confusão citadina estão dispostos a investir em lugares como estes, parecendo-me que a presença de gente das varias faixas etárias nestes lugares, será o melhor convite ao sentimento de inclusão social destas pessoas, conservando a etnicidade e os valores genuínos que sempre identificaram as aldeias.
Projectos como o aldeias do xisto podem servir de referencia.
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“respeitar o passado não é ficar eternamente agarrado a este”

7 comentários:

Abel Alves disse...

Caro Carvalho Leite, partilho da mesma inquietação no que diz respeito às aldeias típicas da nossa região. Pena tenho, que ao longo de muitos anos grande parte deste património tenha caído no esquecimento, em resultado de uma estreita visão turística do nosso país, que privilegiou o centralismo de recursos turísticos centrados no litoral balnear e consequente turísmo de praia. Este esquecimento foi também responsabilidade da nossa cultura social, e da falta de sensibilidade nesta matéria. A pouca procura pelo turísmo rural começou pela nossa exagerada cultura de praia em detrimento do campo, que arrastou as orientações e visões políticas pelo mesmo caminho. A par desta problemática surge a dos atropelos à arquitectura. Tu como arquitecto certamente saberás melhor que eu das aberrações arquitectónicas que têm sido efectuadas nas aldeias rurais um pouco por todo o país. A falta de regulamentos ou o "fechar os olhos" aos regulamentos de licenciamento de construção por parte das autarquias, contribuiram para que se implantassem moradias pirosas, em completo desenquadramento com o património natural e contextos arquitectónicos rurais. Restam poucos bons exemplos que deveriam ser copiados, como o da aldeia de Monsanto na Beira Interior, cujas políticas de construção/recuperação de imóveis têm de obedecer a regras rígidas, a fim de preservar esse mesmo património e identidade, complementados com estratégia e planeamento turísticos bem definidos. Resta-nos preservar aquilo que ainda temos e tentar corrigir o que de errado foi feito.

Se a vivência rústica foi durante anos condenada ao abandono, quer pelo exôdo rural em consequência de políticas de centralismo capitalista urbano, quer pelos baixos índices económicos dos seus residentes, houve ainda um factor importante, que foi a falta de visão e de investimento por parte daqueles que tinham capacidade empreendedora e financeira para fazê-lo, juntamente com inércia e as políticas lobísticas dos nossos últimos governantes. Recordo-me também, de muitos fundos europeus que serviram apenas para os proprietários de moradias rústicas recuperarem os seus imóveis, não cumprindo com as suas obrigações no que diz respeito à divulgação e oferta de turismo de qualidade.

Porém, penso que o Município de Cabeceiras de Basto tem feito algumas apostas felizes neste tipo turísmo. Contudo, falta ainda a capacidade de markting/publicitação das nossas mais valias e o impulso para que as nossas gentes apostem nesta vertente, atraindo ao mesmo tempo, turístas nacionais e estrangeiros.

Mas, para te ser muito sincero não estou muito optimista em relação a esta matéria, porque nós portugueses, teimamos em esperar pelas ajudas do Estado ou pelos fundos europeus, que na actual época de crise, serão nulos. Se a nossa capacidade empreendedora já é reduzida, com actual situação de crise e "medo" de investimento, somados à nossa fraca capacidade de visão de futurista, o desnvolvimento do turísmo rural será muito pontual. Oxalá esteja enganado, e Deus queira que o cenário seja bem diferente. Mas, para que isso aconteça, o impulso terá de vir de nós próprios - sociedade, e das iniciativas locais, porque nos governos centrais eu já não deposito esperanças.

Alexandrina Areias disse...

"Respeitar o passado não é ficar eternamente agarrado a este"

Esta frase diz muito... pois a meu ver, nas aldeias consegue-se ter qualidade de vida e podemos respeitar e valorizar aquilo que nos foi deixado pelos nossos antepassados e isso, não quer dizer que não possa haver desenvolvimento... O grande problema da desertificação das aldeias é porque há muitas pessoas a pensarem que nas aldeias não há qualidade de vida... depois não há motivação e incentivo para os mais novos ficarem, que só pensam em "fugir" para o litoral ou para outros países...

O Carlos fez aqui uma postagem com execelentes idéias para dinamizar as aldeias...
E não há dúvida que por exemplo, uma grande aposta, seria na atracção de pessoas para as aldeias para comprarem os produtos da terra...
Gostei da idéia da função "aldeias lar"... muito interessante!!!
Cumprimentos,

AA

Carlos Leite disse...

Bem hajam meus caros pensadores, pelo contributo

Cara Alexandrina Areias

Concordo com os problemas que aponta, e fico feliz por ter aceite com boas, as soluções aqui apontadas.

Abel Alves, parabéns pelo bom comentário…

Isto da inquietação relativa ás nossas aldeias, é fruto de uma evolução cultural de uma globalização, que ao contrario daquilo que muitos pensam, não torna a cultura homogénea, pois até cada vez temos mais necessidade de evidenciar as nossas especificidades como forma de nos identificarmos perante os outros, e o facto do turismo começar a mostrar interesse na genuinidade do turismo rural, leva a que vejamos o bem precioso que temos, mas que não temos inteligência para explorar.

A nível da arquitectura(e tentando não ser chato), os casos que referiu são de museificações, que acho não ser um caminho a seguir, primeiro porque aldeias museus é uma oferta muito explorada, ,( o turismo étnico apresenta-se cada vez mais como exemplo de futuro) e porque penso que a partir do momento que não tenhamos capacidade de inovar a nossa cultura, a mesma entra em declínio , e repare que as construções de outrora reflectiam uma forma de habitar concebida com melhor técnica que eles tinham de construir, não temos que ficar presos a isso, não me parece que faça sentido continuar a construir com os mesmos materiais e segundo as mesmas técnicas, temos que ter a capacidade de inovar, respeitando o pré existente, sobretudo a nível de escala e da identidade, as pessoas da época se tivessem acesso ao betão, não tenha a mínima duvida que o utilizariam, mas claro que sempre numa lógica de necessidade e não de artificialismos como os que vimos hoje. O grande problema é a qualidade do desenho e da arquitectura, que não é feita de forma a respeitar as pré existências, pois quem constrói e quem desenha na maioria, não tem formação para conservar esses valores. Os regulamentos permitem que em zonas tão sensíveis se faça qualquer coisa, e projectado de qualquer forma, por isso temos os atropelos que temos actualmente. Temos que criar a identidade da nossa época, respeitando as outras é claro, sob pena de ficarmos excluídos da história. Por exemplo acho que exemplos de arquitectura moderna, seriam muito bem-vindos ás aldeias, e enriqueciam-nas.

Quanto á falta de visão de determinadas pessoas que recuperaram os imóveis com dinheiros públicos para meros serviços privados foi a maior provocação feito á nossa sociedade, a ao bom senso dos projectos, pois hoje quem quer investir seriamente está privado de verbas porque as mesmas não foram devidamente utilizadas no passado. E isto impede alguns bons investimentos estruturais que poderiam ser agora determinantes para o sucesso das aldeias.

O grande mal desta terra é que sempre foi pobre, e em que as pessoas sempre viveram no fio da navalha, e por isso com medo de arriscar, e ao mesmo tempo nenhuma plataforma foi criada de forma a garantir algum conforto e poder suportar um eventual risco de negócio.

Como escrevi num post sobre Pardelhas uma aldeia /freguesia de Mondim, o mal dos habitantes das aldeias, é que não gostam delas porque elas lhes são cantadas como sinónimo de miséria, e são esquecidas, e só não a abandonam por falta de alternativa e porque na maioria, pela acentuada idade já lá tem raízes muito fortes.

É preciso um forte plano estratégico para inverter esta situação, todas as questões que aqui levantou podem ser abordadas num plano estratégico, por isso era bom que o mesmo constasse nas listas dos partidos candidatos as autarquias, pois estas aldeias precisam de uma atenção especial, pois penso que é lá que reside muitos dos valores que podem servir de alavanca ao desenvolvimento das nossas terras, sendo fulcral a participação da população e a disposição para inverter a decadência que vivem.


Obrigado e voltem sempre.

Abel Alves disse...

Carvalho leite, quando falei da arquitectura não me estava a referir a museificações, estava a referir-me a moradias particulares que foram construídas ao longo dos anos, implantadas entre as rustícas casinhas das aldeias, moradias essas, do mais piroso e inapropriado para a sua área de implantação. Talvez não conheça aldeias com esta problemática porque felizmente ainda temos muitas, que nesta matéria, permanecem intocáveis.

Efectivamente não sou contra modernizar-se a arquitectura nestas aldeias, antes pelo contrário, as próprias casinhas velhas e a caír de desabitadas que estão, poderiam sofrer modificações arquitectónicas para modernizar a sua estrutura, melhorando a habitabilidade e a estética. Contudo, tem de haver regras e um certo padrão, que permita manter a identidade das aldeias. Apenas acho que tem de haver muita sensibilidade por parte dos arquitectos e promotores dos projectos, para que se consiga implantar edifícios modernos sem chocar com os rústicos. Há belos exemplos destes espalhados pelo país, mas poucos. Acima de tudo, as autarquias têm de fazer para que se cumpra a lei nas questões de ordenamento do território e na preservação do património natural e histórico, porque este é sem dúvida o principal problema.

É curioso analisar a sua linha de pensamento - "respeitar o passado não é ficar eternamente agarrado a este". Eu no remisso, há dias atrás, elaborei uns post´s em que a minha linha de pensamento foi - "reciclar o velho com sentido de modernidade". Fico contento por poder partilhar opinião com pessoas que olham para o futuro, não se prendendo a questões do passado para viverem o presente.

Anónimo disse...

Vistem esta aldeia remodelada pela Empresa Ramos Catarino. Aldeia de Povoa Dão, distrito de Viseu.
www.povoadao.com

Anónimo disse...

"Outra função que se poderia dar era a de “aldeias lar”, que passaria pela recuperação das habitações e adaptação ás exigências de agora, complementando-as com uma micro clínica geriátrica, de forma a criar condições quer para os idosos que lá vivem(...)"

Impressão minha, ou este conceito de "aldeias lar" é um processo de "guetização" de idosos. Não é por mal, certamente.

O futuro reserva a inclusão social como deve ser, ou seja, nas famílias ou em outro tipo de organização social. Não no continuar de "exilar" os idosos em edifícios ou em aldeias.

Carlos Leite disse...

Caro Abel Alves,essa problemática está patente em quase todas as aldeias das nossas terras de basto, e conheço bem o problema, mas falava de arquitectura de forma generalista, mesmo popular, ou de mau engenheiro ou mau desenhador, da maioria dos casos ou projectos que para lá são feitos, pois caso não saiba a arquitectura no sentido basico do termo, nas leis do nosso país , não precisa de arquitectos, e os problemas de muitas aberraçoes é esse. mas o facto de não haver gosto nestas aldeias, ajuda a que a beleza da mesma seja sobreposta por interesses proprios.
Tive oportunidade de ler esse texto no “remisso” e estou de acordo com o que lá foi escrito, e estou a ver que muitas das confusões aqui geradas aqui nos comentários tem a ver com sentidos distintos que demos às palavras, mas as ideias que compõe o cerne das questões apontam no mesmo caminho.

Caro anónimo obrigado pela sugestão, é preciso atrair esse tipo de investimento para a nossa região.

Caro Jacinto, claro que a exclusão social deve ser combatida, e acho também que este tipo de solução é um avanço enorme em termos de inclusão comparada com os actuais lares de terceira idade, que esses ao contrario das aldeias, são elaborados apenas para uma faixa etária, 3ªidade, e se puder reparar, referi que a atracção e presença de diferentes faixas etárias seria o melhor convite para o sentimento de inclusão social .O que me parece sugestivo neste tipo de apostas, não é focalizar as intervenções a um público-alvo, mas manter um maior dinamismo possível investindo nas actividades existentes e atrair as outras, e citei as aldeias lar, porque parece-me que faltam os bons investimentos nesta faixa etária, que é a que terá um peso cada vez mais considerável, e neste caso parece-me que a estas aldeias falta apenas as clínicas geriátricas, pois tem tudo o que é louvável para quem procura o sossego e a boa qualidade de vida.

obrigado a todos